A ultrassonografia transcraniana para distúrbios do movimento é uma forma de ecografia cerebral. É um exame que analisa regiões no encéfalo que podem estar alteradas na doença de Parkinson e em outras patologias similares. É um exame rápido, não invasivo e sem necessidade de contraste. Auxilia no diagnóstico da doença de Parkinson e em seus diagnósticos diferenciais, como parkinsonismo atípico, parkinsonismo medicamentoso e tremor essencial. A ultrassonografia transcraniana é útil quando há dúvida diagnóstica entre essas patologias.
Esse exame foi desenvolvido por uma equipe de neurologistas alemães, a partir do final da década de 1990, liderados pelos doutores Georg Becker, Uwe Walter e Daniela Berg. A Dra. Daniela Berg é uma importante pesquisadora da Sociedade Internacional de Parkinson e Distúrbios do Movimento (International Parkinson and Movement Disorder Society). Além de estudos em ultrassonografia, ela também realiza várias pesquisas em outras áreas da doença de Parkinson, como Parkinson prodrômico e tratamento. Participou na formulação de vários guidelines internacionais na área, como critérios diagnósticos e estratégias terapêuticas. A nível nacional, nossa equipe médica, em conjunto com outros colaboradores, realizou um estudo no Brasil demonstrando a utilidade da ecografia transcraniana no diagnóstico da doença de Parkinson (vide referência 1).
O que esse exame de fato detecta? Sabe-se que na doença de Parkinson há degeneração (perda de neurônios) da substância negra, localizada no mesencéfalo. A substância negra é uma região rica em neurônios dopaminérgicos. Na ultrassonografia transcraniana, observa-se que pacientes com doença de Parkinson apresentam alterações na imagem ecográfica da substância negra. Essa alteração é chamada de hiperecogenicidade da substância negra. Pacientes com tremor essencial ou parkinsonismo medicamentoso em geral não possuem essa hiperecogenicidade.
O parkinsonismo atípico, por sua vez, consiste em, basicamente, quatro doenças diferentes: paralisia supranuclear (PSP), atrofia de múltiplos sistemas (AMS), demência com corpos de Lewy (DCL) e degeneração corticobasal (DCB). Muitas vezes, pode haver dúvida se o paciente possui o diagnóstico de doença de Parkinson ou parkinsonismo atípico. Em pacientes com parkinsonismo atípico, há outras alterações
na ultrassonografia, que podem auxiliar no diagnóstico. Na PSP, há aumento do diâmetro do terceiro ventrículo, secundário à atrofia do mesencéfalo. Nos parkinsonismos atípicos também pode ser encontrado hiperecogenicidade de núcleos da base, o que em geral não ocorre na doença de Parkinson.
Além desses distúrbios do movimento, há estudos apontando alterações na ultrassonografia transcraniana em outras doenças. Há, por exemplo, uma associação entre hipoecogenicidade da rafe mediana mesencefálica e transtorno depressivo maior. Uma outra patologia, a distonia cervical, na qual ocorrem espasmos dos músculos do pescoço, apresenta hiperecogenicidade do núcleo lentiforme em 75% dos pacientes. Além disso, a ultrassonografia transcraniana também pode demonstrar aumento do diâmetro dos ventrículos laterais, o que se associa a redução volumétrica encefálica e/ou hidrocefalia (ex: hidrocefalia de pressão normal – HPN). Estudos indicam que pacientes com transtorno comportamental do sono REM, uma alteração do sono, podem apresentar hiperecogenicidade da substância negra.
Referências
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